Há 12 dias, o então presidente do BNB fazia planos para o banco, sem imaginar que acabaria renunciando
No mês em que completaria o primeiro aniversário à frente do Banco do Nordeste (BNB), o geógrafo Jurandir Vieira Santiago, deixou a instituição, após um período marcado por avanços na área econômica do banco. Ao mesmo tempo, a instituição vive um momento difícil, no qual apura denúncias de supostos desvios de recursos em operações financeiras em algumas agências, além de problemas de interferências político-partidárias na diretoria.
Foi um ano marcado também por alterações na política de financiamentos do BNB, que historicamente sempre destinou cerca de 70% dos recursos para projetos de grandes empresas e, agora, por determinação Federal, se volta preferencialmente ao microcrédito, ao financiamento de micros, pequenas e médias empresas no Nordeste.
Em entrevista ao Diário do Nordeste, um dia antes de "estourarem" os escândalos, Santiago fez um balanço da saúde financeira do BNB, falou das alterações porque passa o banco e traçou metas para o futuro, sem saber que dias depois acabaria renunciando.
O nome dele foi incluído na denúncia-crime que havia sido feita ao prefeito de Ipu, Sávio Pontes e demais envolvidos supostas em irregularidades no repasse de recursos públicos destinados à construção de banheiros naquele município, em 2009. Santiago era secretário-adjunto da Secretaria das Cidades.
Saúde financeira
De acordo com Jurandir Santiago, "a saúde financeira do banco está muito bem". Conforme disse, o BNB, hoje, tem Patrimônio Líquido de R$ 2,5 bilhões e Patrimônio de Referência de R$ 4 bilhões, além de gozar de posição de destaque nos enquadramentos bancários, a exemplo do índice de Basileia, que exige comprometimento de 11%, e o banco registra atualmente,16,6%.
"Temos crescido nas operações de crédito, ano a ano. Em 2011, o banco aplicou R$ 21 bilhões, e neste ano queremos alcançar a marca de R$ 25 bilhões, em números reais, na carteira geral", projetou Santiago. Desse total, explicitou, R$ 11 bilhões foram (em 2011) do FNE, e em 2012, o banco já trabalha com R$ 11,5 bilhões. "No microcrédito queremos alcançar a marca de R$ 4 bilhões", em 2012, destacava Santiago. Ainda segundo ele, o retorno sobre patrimônio líquido no primeiro quadrimestre deste ano, bateu 20%, seis pontos percentuais acima dos 14% registrados em igual período de 2011.
"Isso mostra que melhoramos substancialmente", animava-se o economista, ao contabilizar lucro de R$ 152 milhões, nos primeiros quatro meses de 2012; 53,5% maior do que os R$ 99 milhões anotados no primeiro quadrimestre do ano passado. "O banco está muito bem, está firme", garantiu à época, Santiago, mesmo diante das perdas de espaços para o BNDES e da exclusividade na administração dos recursos do Fundo de Desenvolvimento do Nordeste (FDNE) e dos escândalos financeiros que, conforme disse, já vinham sendo investigados pela própria auditoria do banco, além do Ministério Público e Controladoria Geral da União.
Captação
Agora, imerso por denúncias e problemas de ordem jurídica e política, Jurandir Santiago sai do banco deixando para o sucessor uma série de metas traçadas nos últimos meses, mas também o desafio de evitar o esvaziamento do BNB e de elevar o moral da instituição.
Recursos
Para tanto, ele disse que estava buscando "fundings", recursos, em várias frentes, como no BNDES, onde o banco tem demanda de R$ 2 bilhões, mas só recebeu R$ 500 milhões, neste ano. No Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), ele conseguiu recentemente US$ 1,2 bilhão, para investimentos nos Estados nordestinos, além de contar ainda com os recursos do FNE, do FAT e do retorno dos próprios investimentos do BNB.
Sementes e desafios
Apesar de pactuar com a política do Governo Federal de concentração dos recursos para investimentos no BNDES, Santiago, disse que plantou sementes, elaborou projetos para dar maior agilidade nas operações e ampliar a participação e capilaridade do banco, no Nordeste. Nesse sentido, ele defendeu mais investimentos em novas tecnologias para modernizar os sistemas de atendimento das agências e a realização de parcerias com o Banco do Brasil e a Caixa Econômica Federal, para compartilhamento da rede de agências pelos clientes das três instituições.
"Estamos investindo na bancarização das famílias de baixa renda", informou Santiago, ao apontar a emissão de mais de 1,5 milhão de cartões de débitos bancários e operações de crédito e de microfinanças. Além disso, sinalizou com a instalação de mais 25 agências este ano, na região, e com estudos para implantação de mais 83 unidades, o que elevaria das atuais 180 para mais de 300 agências no Nordeste, Norte de Minas Gerais e Espírito Santo. Fica para o próximo presidente do BNB.
Produtores rurais mais preocupados
Como se não bastasse os efeitos nocivos da estiagem deste ano, que só no 3º trimestre, implicou em um recuo de 9,5% na produção do setor agropecuário ante igual período do ano anterior; outro motivo vem trazendo preocupação aos produtores rurais cearenses. Para eles, os recentes acontecimentos relacionados ao Banco do Nordeste do Brasil (BNB) eclodem em um momento muito delicado para toda a cadeia produtiva.
Na opinião do presidente da Federação da Agricultura do Estado do Ceará (Faec), Flávio Saboya, as medidas para amenizar as consequências climáticas podem ser postergadas. "Estamos muito preocupados com essa situação, principalmente porque ela ocorre durante uma seca devastadora. Isso pode refletir em diversos segmentos que o BNB apoia, como crédito de emergência e renegociação de dívidas rurais para amenizar esse quadro", comenta Flávio.
Hiato atrapalha
De acordo com o presidente da Faec, existe uma boa sintonia entre as entidades que representam o setor agropecuário cearense e nordestino como um todo e a direção do banco.
"A seca aproximou essa relação. Estamos sistematicamente reunidos para traçar estratégias contra a estiagem. A ausência de direção do banco, ou melhor, o hiato necessário para se resolver essas questões internas, nesse exato momento, pode atrasar a liberação de recursos e a tomada de decisões importantes para o setor", avalia.
O QUE ELES PENSAM
Preservar o banco é preciso
O BNB é um ícone para região. Banco de fomento que tem como objetivo de tornar produtivos diversos segmentos como o das indústrias, empresas de atividade comercial, agentes do setor agropecuário e praticamente toda a cadeia de serviços. Sou contra o esvaziamento do BNB. Temos que evitar o que já ocorreu com a Sudene, em âmbito regional, e com o Banco Nacional de Habitação (BNH), na esfera nacional, que acabou sendo incorporado à Caixa Econômica.
Começaram nesses órgãos um processo de esvaziamento que não pode se repetir. Os nordestinos não têm interesse que aconteça o mesmo com o Banco do Nordeste. Temos que preservar a instituição porque vivemos numa região de clima único no Brasil. E Ninguém melhor do que o BNB, com seu Know How e expertise adequados para atuar nessa área. Repito que sou contra qualquer tentativa de esvaziamento do banco, principalmente se houver motivos alheios.
CID ALVES
Presidente do Sindilojas Fortaleza
Como os demais, vejo de forma preocupante essa situação. O importante é que a gente preserve as instituições públicas. E que essas questões de natureza pontual não venham macular as instituições públicas. Precisamos ter um órgão de fortalecimento da economia regional, e o papel do BNB é esse. Precisamos ter um órgão, que estabeleça as bases, a matriz do desenvolvimento regional. O que está ocorrendo é muito ruim porque você acaba mistificando algumas coisas e cria espaço pra esvaziar a função. Sudene, Dnocs e BNB são órgãos importantes para o desenvolvimento regional. Acho que a presidenta precisa ter um olhar institucional. E que essas situações não venham prejudicar as linhas de financiamento, atuação e olhar de desenvolvimento regional que estas instituições precisam ter. Esse momento é importante para se redesenhar o papel do BNB, ou seja, como ele pode atuar daqui pra frente com a preservação dos interesses da economia local
Alexandre Cialdini
Secretário de Finanças de Fortaleza
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