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Notícias

  29/11/2010 

A violência no senso comum do brasileiro

Por Bruno Meschesi Silva*

Torna-se urgente que o povo saia do papel passivo de mero espectador diante da violência espetacularizada pela mídia.

No senso comum do brasileiro o aumento da violência aparece como um fenômeno intimamente relacionado com a corrupção, envolvendo promíscuas relações entre o crime organizado com alguns policiais e políticos. Os meios de comunicação de massa têm tido um papel importante na formação desse imaginário.

A relação de corrupção com o crime organizado tem sido vista pela população como o principal fator responsável pela violência no país, mais do que qualquer outro, incluindo os de ordem socioeconômica que, sabemos, contribui para o problema. Esta visão torna-se bastante ameaçadora, ainda mais se considerarmos que ela põe em xeque a credibilidade dos poderes e das instituições públicas responsáveis por garantir o bom funcionamento do estado de direito.

Convém mencionar, ainda, que, em alguns casos, o crime organizado passou a ser comandado pelas milícias, nova modalidade de atuação do crime, agora não mais comandado por marginais das próprias comunidades periféricas, mas, sim, por agentes que deveriam zelar pela segurança pública, sendo muitas vezes aliados a políticos para conseguirem impor o controle em várias comunidades.

Tudo isto vem acontecendo ao lado de algumas iniciativas, como as que vêm sendo implantadas no estado do Rio de Janeiro através das Unidades de Polícias Pacificadoras – UPPs, que buscam retomar o comando dos territórios que antes eram ocupados por facções criminosas, muito embora todo esse esforço seja ainda incipiente diante do principal objetivo, que consiste em humanizar a atuação da polícia para garantir maior segurança e paz aos cidadãos que residem nestas comunidades.

Neste contexto, torna-se urgente que o povo saia do papel passivo de mero espectador diante da violência espetacularizada pela mídia, com notícias que a tornam banal. O que tem reforçado a idéia da impossibilidade de mudanças de sentidos e atitudes por parte da sociedade, posto que “naturaliza” e ainda reforça a idéia de que a violência que nos afeta no cotidiano nada mais é do que o reflexo da corrupção em níveis elevados. Para a população conseguir superar o estado de violência que vigora é preciso que as pessoas assumam outra atitude radicalmente diferente da que vem predominando.

Sabemos que o cenário de violência que afeta a população só será efetivamente transformado caso a sociedade civil se organize e passe a assumir outro tipo de atitude mais protagônica em relação às instituições públicas, e não só em relação às polícias vinculadas as Secretarias de Segurança Pública, mas também em relação aos políticos que atuam, fundamentalmente, nas esferas estaduais e municipais, onde o cidadão comum sente e sofre o reflexo mais direto dos tipos de violências cometidos no cotidiano. E isso significa ampliar o sentido de cidadania com políticas que envolvam a educação e a cultura, principalmente. Enfim, só superando o conformismo e nos mobilizando com uma outra agenda, mais ampliada, do tema da segurança, poderemos superar o estado de violência através das nossas próprias mudanças de atitudes.
Mas o que tem se observado é justamente o contrário, a população tem se isolado do mundo a partir do aumento do individualismo, que a torna cada vez mais impotente para exigir o cumprimento das leis já existentes ou que precisam ser aprimoradas pelo legislativo para que cumpram o seu efetivo papel.

Para alterar este cenário de violência a sociedade precisa participar da idealização e implementação de instrumentos de participação democrática que assegurem uma maior fiscalização por parte da sociedade civil organizada, no que se refere às políticas na área da segurança pública do país, de modo a que se promova uma ação coletiva mais articulada com as polícias e os políticos, para que atuem mais efetivamente em prol do bom funcionamento das coisas que dizem respeito aos interesses da vida pública – res publica. Assim, ao invés de nos conformarmos, e continuarmos a deixar as coisas como estão, devemos atuar de forma consciente para exigirmos que os nossos interesses (direitos) relativos à qualidade dos serviços públicos no âmbito da segurança sejam por nós conhecidos, debatidos e validados. É o que, inclusive, já nos garante a Constituição Federal de 1988, por meio do Decreto 2.169/97, que cria o Conselho Nacional de Segurança Pública – CONASP. Nesse sentido, por que não propormos a criação de Conselhos Estaduais e Municipais de Segurança Pública, para que estes possam funcionar de forma mais articulada com os cidadãos, onde se façam representar os movimentos sociais e organizações da sociedade civil para ter voz mais ativa em relação aos debates e proposições que envolvam a área da segurança pública do país? Daí, sim, poderia haver uma política em âmbito nacional de segurança pública articulada aos Estados e Municípios.     

Acreditamos que só assim poderão ocorrer mudanças significativas em relação ao nosso futuro comum, que se anuncia trágico enquanto continuarmos conformados e passivos, com medo diante de tanta violência que nos invade o cotidiano. Pois enquanto continuarmos a delegar passivamente o poder aos nossos representantes e a opinião pública continuar se encarregando muito mais em repercutir os escândalos do que as boas iniciativas que alguns políticos se esforçam por realizar em benefício do interesse público, continuaremos a reproduzir o estado de coisas que aí está.

Não será repetindo frases do senso comum como “todo político é corrupto” e “a política corrompe mesmo os que procuram ser honestos”, que conseguiremos superar o problema concreto da violência. Afinal, se olharmos mais em baixo, para bem mais próximo de nós mesmos, veríamos que muitos pequenos atos de corrupção povoam o nosso cotidiano. E talvez devêssemos concluir que esses maus políticos nos representam com mais fidelidade do que gostaríamos de acreditar. Quem sabe assim começaríamos a sair da passividade e ver que o inferno não está necessariamente nos outros, nem somente em cima.


(*)Bruno Meschesi Silva é sociólogo.

Fonte: Brasil de Fato
Link: http://www.brasildefato.com.br/node/5155
Última atualização: 29/11/2010 às 08:44:00
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