O presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, lançou nesta quarta-feira (17) um plano de ''reforma radical na regulação do sistema financeiro'', que ele próprio descreveu como a maior reforma desde o New Deal dos anos 1930. ''O livre mercado foi e continuará sendo o motor'', disse, mas ''a ausência de um regime regulatório em funcionamento sobre o sistema levou-nos para perto da catástrofe''.
Obama durante o discurso: ''cuidadoso equilíbrio'' ''Meu governo propõe hoje uma reforma radical na regulação do sistema financeiro, uma transformação numa escala que não era vista desde as reformas subsequentes à Grande Depressão'', afirmou Obama durante discurso na Casa Branca, referindo-se à crise de 1929.
Uma no cravo, outra na ferradura
O discurso popôs um ''cuidadoso equilíbrio'' entre as pressões antagônicas que incidem sobre o novo ocupante da Casa Branca. De um lado, os conservadores, que o acusam de ''socialista'', sob o comando do ex-vice-presidente Dick Cheney. De outro, os seus eleitores, desapontados com o seu início de governo, que cobram o bordão da campanha eleitoral: ''mudança''.
Todo o discurso equilibrou-se nesse tênue fio de navalha: ''Nós fomos convocados a colocar em prática reformas que permitam que nossas melhores qualidades floresçam, ao mesmo tempo em que mantêm os piores traços sob controle'', disse Obama. ''Nós fomos convocados a reconhecer que o mercado livre é a mais poderosa força geradora de nossa prosperidade, mas não é uma licença livre para ignorar as consequências de nossas ações.''
''O livre mercado foi e continuará sendo o motor do progresso americano'', destacou ainda Obama. Garantiu que nunca perdeu a fé no livre mercado e o papel do Estado não é o de reprimir os mercados, ''mas o de dar asas a sua criatividade e inovação''.
Porém investiu contra o que chamou de ''equívocos e oportunidades perdidas em cascata'', que se prolongaram por ''décadas''. Disse que ''era dinheiro fácil, enquanto durou'' mas ''esses esquemas tinham sido construídos sobre um monte de areia''.
Em alguns trechos Obama culpou ''o sistema'' americano pelo descontrole. ''Muitos americanos compraram casas e pediram dinheiro emprestado sem se informar adequadamente sobre os termos e sem frequentemente arcar com suas responsabilidades'', assegurou. ''Esta não foi simplesmente uma falha dos indivíduos, foi uma falha de todo o sistema'', agregou.
''Novos alicerces, robustos, vibrantes...''
A ambição da Casa Branca, segundo o discurso, é criar ''novos alicerces'' para o sistema. ''Esses novos alicerces também exigem mercados financeiros robustos, vibrantes, que operem de forma transparente e justa para proteger os consumidores e a economia da devastadora decomposição dos anos recentes'', expressou.
''As reformas propostas hoje buscam a aplicação de regras para permitir que nossos mercados impulsionem a inovação e desencorajem os abusos'', disse ainda o presidente. Disse também que seu plano se preocupará, ''pela primeira vez'', não só com casos individuais mas ''com a estabilidade do sistema em seu conjunto''.
''Ninguém tinha a responsabilidade de proteger o conjunto do sistema dos riscos vinculados às firmas. Chegou a hora de isso mudar'', assegurou.
O que foi proposto de concreto
As mudanças foram sintetizadas pelo New York Times como ''uma impetuosa revisão das regulações financeiras, estabelecendo limitações para as grandes instituições bancárias e dando novos e amplos poderes ao Federal Reserve (ou Fed, o banco central dos EUA) para manter os consumidores longe de onerosas hipotecas que não conseguem suportar''.
Obama propôs que o Fed ''tenha novas competências e responsabilidades para regular as companhias bancárias e outras grandes firmas que, se fracassarem, põem um risco toda uma economia''. O Federal Reserve passaria a supervisionar as grandes empresas - ''grandes demais para quebrar'', como virou moda dizer durante a atual crise - e colocar os fundos de private equity e de hedge sob o exame das autoridades federais dos EUA.
Obama pretende criar um conselho de autoridades reguladoras, que incluirá o Fed e será presidido pelo secretário do Tesouro, com a tarefa de monitorar o risco do sistema. Sua função: ''lidar com questões que não se encaixam nitidamente em um mapa organizacional''.
No Congresso, fogo cruzado
O plano de Obama ainda terá que passar pelo Congresso. Prevê-se que as pressões contraditórias darão lugar a uma guerra de lobbies pressionando os congressistas.
Michael Steele, líder do Partido Republicano, que tem votado sistematicamente contra Obama mas está em minoria nas duas casas legislativas, criticou o plano. ''Pelo que temos cisto com as empresas automobilísticas, bancos, seguradoras e nosso sistema de saúde, a solução do presidente Obama é dar mais poderes para o governo federal dirigir em detalhes a economia americana'', reclamou Steele.
Já o senador Bernard Sanders (independente, de Vermont), tido como um liberal (nos EUA, o equivalente de posições à esquerda), achou o plano ''um passo na direção certa''. Mas pediu mais: ''Para começar, precisamos de criar uma lei nacional da usura, de modo que os bancos não possam cobrar taxas de juros ultrajantes e serviços que sobrem aos céus'', disparou.
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