Em 2009, o Congresso volta a discutir as reformas política e tributária. Mesmo se aprovados, os projetos bancados pelo governo Lula podem acabar sem promover mudanças reais no País
E estão em pauta no Congresso, para 2009, duas das mais polêmicas reformas do Estado brasileiro. As reformas política e tributária se arrastam há décadas em discussões acaloradas, resultando sempre - quando são submetidas à votação - em paliativos ou alterações pontuais.
A reforma tributária está prevista para ir a votação no plenário da Câmara em março. A política deve ir a discussão em comissão especial, depois da aprovação de uma série de propostas de emendas constitucionais pela Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados, na última terça-feira.
Mais uma vez, contudo, o Brasil deve sair das votações dessas reformas - independente do resultado - ainda precisando de reformas. É o que dizem os especialistas com que O POVO conversou. Cientistas sociais, economistas e tributaristas avaliam que mesmo que as propostas que estão sendo discutidas venham a ser aprovadas, as mudanças serão, mais uma vez, superficiais.
Para a reforma política, os analistas projetam um cenário de onde podem sair alterações como o fim das coligações para eleições para vereadores e deputados, teto para gastos de campanha e, até mesmo, o fim da reeleição. Mas pontos mais radicais, como votação em lista fechada, critérios de inelegibilidade e financiamento público exclusivo, devem ficar de fora. Para a reforma tributária, o cenário também não é favorável. Ainda sem consenso para a votação, mesmo se aprovada, ela não deve desonerar efetivamente o empresariado, e deve ter ainda menos impacto para o consumidor.
E-Mais
Aprovado na comissão especial em votação que entrou pela madrugada do dia 20 de novembro, o texto da reforma tributária deve ir a votação na Câmara em março de 2009.
O governo pretendia votar a reforma ainda em 2008, mas com as movimentações de obstrução da oposição, a votação acabou sendo adiada.
O acordo pelo adiamento, contudo, não significa que a oposição aderiu ao projeto defendido pelo governo Lula.
Em agosto, o governo enviou à Câmara seis propostas relativas a à reforma política.
Votação em lista fechada, financiamento público de campanha, infidelidade partidária, critérios de inelegibilidade, cláusula de barreira, regras para coligações são os temas abordados.
Os projetos que passaram pela Comissão de Constituição e Justiça, contudo, não entram em nenhuma das discussões levantadas pelo Planalto.
Projetos: para analistas, mudar só o possível não basta
Para virar lei, as reformas deparam com a difícil equação que envolve aquilo que é necessário e o que pode conseguir apoio para as votações no Congresso
“Infelizmente ela (reforma tributária) não é a que todo mundo desejava. Nem empresariado, nem fisco, nem acadêmicos”. A frase, do professor de Direito Tributário da Universidade de São Paulo (USP), Roberto Quiroga Mosqueira, ilustra o conflito que existe entre as propostas tidas como necessárias ou desejáveis e o “possível”. Dificuldade vivida também pela reforma política. Os temas, debatidos à exaustão durante anos, ou ficam reduzidos a pontos superficiais ou enfrentam o destino incômodo da gaveta.
Mosqueira avalia que o projeto de reforma tributária que atualmente está em discussão é parcial. Ele aponta que para haver mudança efetiva, seria necessário promover simplificação e desoneração, simultaneamente.
Para o assessor de Política Fiscal e Orçamentária do Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc), economista Evilásio Salvador, o principal ponto ausente da reforma tributária é a alteração na maneira de fazer justiça social. Salvador disse considerar que mesmo que a reforma traga benefícios para o empresariado, o sistema tributário continua a pesar mais para os mais pobres.
O economista aponta como necessário para fazer uma “verdadeira” reforma a desoneração do consumo e maior tributação sobre renda e patrimônio. E essas mudanças seriam até mais fáceis do que o que se está propondo, diz, já que poderiam ser feitas por leis ordinárias.
Reforma política
Charles Pessanha, professor de Ciência Política da Universidade Federal do Rio de Janeiro (URFJ), avalia que poucas são as questões polêmicas da discussão da reforma política com reais chances de virar lei. Ele disse considerar que pontos relativamente “fáceis” de serem aprovados e que têm potencial de ter grande efeito seriam o fim das coligações para eleições proporcionais - ve-readores e deputados - e a alteração do critério para escolha de suplentes de senadores - hoje, muitas vezes parentes dos titulares ou financiadores de campanha.
Leonardo Barreto, professor de Ciência Política da Universidade de Brasília (UnB) projetou que mudanças que podem ser esperadas são a abertura de uma “janela” para a troca de partidos - que seria “desfazer” um avanço contra a infidelidade - e alguma medida relativa ao financiamento de campanha, como o estabelecimento de teto de gastos. “Qualquer coisa que traga uma mudança efetiva das regras é muito difícil de ser aprovada”, concluiu.
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