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Saiu na Imprensa

  13/11/2008 

Banco do Sul: um FMI sul-americano ou um financiador da solidariedade?

Movimentos defendem paridade entre países nas decisões do novo órgão; mas Brasil quer peso maior para sua economia

A criação de instituições de poder regional na América do Sul torna-se ainda mais urgente diante de uma crise internacional, cuja real dimensão ainda não pode ser mensurada. Com base nessa avaliação, especialistas apontam a relevância e a necessidade de se avançar o debate acerca do Banco do Sul, uma alternativa para os povos da América do Sul à dependência em relação aos organismos multilaterais do Norte.
Em momentos de crise e recessão, o caminho tradicional dos países do Sul é recorrer aos socorros financeiros de órgãos como o Fundo Monetário Internacional (FMI) e o Banco Mundial. No entanto, todos os países que contraíram dívidas com essas instituições conhecem as conseqüências: dependência financeira e submissão às políticas liberalizantes exigidas como contrapartidas.

Daí a importância de consolidar um organismo financeiro para que os países sul-americanos possam recorrer a um órgão próprio em momentos como o atual. O Banco do Sul está prestes a se tornar uma realidade. No dia 10, uma reunião em Caracas (Venezuela) acertou os últimos detalhes de um documento que deve formalizar o nascimento do banco. Além de representantes venezuelanos, o encontro contou com delegados do Brasil, Argentina, Bolívia, Equador, Paraguai e Uruguai.

Em um novo encontro a ser realizado em breve, o texto deve ser finalizado e enviado aos mandatários dos países signatários, para que apontem suas ponderações. Inicialmente, o banco deve contar com um capital de 20 bilhões de dólares e o aporte de cada país deve ser proporcional à sua economia.

Divergências

O representante venezuelano na reunião, Eudomar Tovar, afirmou que, com o Banco do Sul, "os Estados da região não terão que buscar recursos no exterior, pois poderão canalizar suas reservas para projetos de investimento e, dessa forma, a vulnerabilidade financeira será menor".

É com base nesses argumentos que os movimentos sociais e alguns governos sul-americanos, como o equatoriano e o boliviano, têm defendido a criação do Banco do Sul. Porém, há divergências entre movimentos sociais e outros governos a respeito de como deve ser o funcionamento da instituição. De um lado, as organizações defendem que o órgão rompa com a lógica de investir em projetos que integrem o capital, ao invés dos povos, e passem a financiar o desenvolvimento social dos países, respeitando a soberania de cada um. No outro lado, alguns governos, como o brasileiro, defendem que os países que concederem maior aporte financeiro tenham maior peso nas decisões da instituição. A crítica dos movimentos a essa posição dá conta de que nos órgãos do Norte a composição é feita dessa maneira: cada dólar, um voto. Atualmente, os EUA têm sozinhos 17% dos votos do FMI e, no Banco Mundial, os países do G8 concentram mais da metade dos votos.

Para Gabriel Strautman, secretário-executivo sobre instituições multilaterais da Rede Brasil, o modelo de peso por tamanho de economia não condiz com o projeto de banco solidário que os movimentos sociais esperam da iniciativa sul-americana. “Os órgãos em que os países ricos têm mais poder de voto atendem às determinações deles. Para criar um projeto solidário, é preciso inverter essa lógica. As maiores economias têm sim que colocar mais recursos. E a dinâmica deve ser: cada país, um voto. Tem          que haver uma mudança na governança das instituições”, defende.

Strautman aponta uma contradição no discurso do governo brasileiro. “Recentemente, o Brasil clamou por uma alteração nos organismos multilaterais, reivindicando maior poder de decisão para os países em desenvolvimento. No entanto, no Banco do Sul, eles defendem o mesmo modelo do Norte. Na construção do banco, tem que haver um esforço de solidariedade, se não vai ser um processo viciado de reprodução dos bancos do Norte”, afirma.

Para ele, o país deve ficar atento e rejeitar as investidas do FMI, que recentemente se disse capaz de conceder empréstimos rápidos aos países que necessitarem. “Eles enxergam a crise como uma oportunidade. O que o FMI oferece como solução, na verdade é a causa da crise: as políticas ultra-liberais, que acarretam em privatização, desregulamentação do fluxo de capitais e a diminuição do papel do Estado”, diz.

Lógica antiga

De acordo com Fátima Melo, coordenadora da Federação de Órgãos para Assistência Social e Educacional (Fase), o Brasil, com essa postura, segue os antigos preceitos definidos nas convenções de Bretton Woods, em 1944. “Para os países que têm mais poder, existem dois caminhos: o de se impor, com o uso da força, ou o da concertação. O destino dos países maiores está ligado aos países vizinhos. As nações com as maiores economias têm que pagar uma conta proporcional ao seu poder. Portanto, se o Brasil e a Argentina têm maior condição de aportar recursos, devem fazê-lo, em seu interesse e em interesse dos demais. Se não, vira um unilateralismo aos moldes do [presidente dos EUA George W.] Bush, que determina a lógica que levou ao desastre que o mundo se encontra hoje”, explica.

Já Emir Sader, sociólogo da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj), acredita que o funcionamento do novo órgão deve seguir uma perspectiva mais realista, diante do quadro político atual. “Tem que haver uma decisão equilibrada. Se cada país tiver o mesmo peso, isso pode induzir os países com mais recursos a não destinar todas as suas reservas para o Banco do Sul. É necessário que se combine as perspectivas democráticas, de cada país ter o mesmo peso, com as realistas, pois as concepções dominantes no continente não são tão democráticas. O mesmo deve ser feito em relação às taxas de juros: elas têm que estar abaixo dos patamares mundiais, mas não se pode emprestar a fundo perdido, pois o banco pode quebrar”, considera.

Hegemonia

Para o sociólogo, ainda que o Banco do Sul não consiga fazer frente à hegemonia construída pelas instituições financeiras internacionais, o nascimento da nova instituição pode contribuir para uma ordem mundial menos concentrada. “A criação do banco não põe em risco [a predominância do FMI e Banco Mundial] porque ele não terá um peso determinante na economia mundial. Mas ele aponta para a criação de uma moeda única e de um banco central único que irá aplicar políticas econômicas que, ainda que não sejam únicas, serão convergentes. Enfim, o banco é uma boa solução para a construção de um mundo multipolar”, conclui.

 

 
 
 

 

Fonte: Brasil de Fato
Última atualização: 13/11/2008 às 15:26:00
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