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Saiu na Imprensa |
01/08/2008 |
Economia de revolução? |
Notou-se algo de cruel nas negociações da Rodada de Doha acerca do comércio internacional. Enquanto os países ricos se negavam a diminuir os subsídios agrícolas e modificar outros itens da agenda comercial para preservar seu alto nível de consumo, outros lutavam, desesperadamente, para garantir a sobrevivência de seus povos. A visão dos países opulentos é míope, pois já se instalou a crise alimentar, possivelmente de longa duração, podendo afetar a eles, mas muito mais a milhões e milhões de pessoas, confrontadas não com a pobreza, mas diretamente com a morte.
Já estouraram revoltas de famintos em 40 países sem que a imprensa empresarial, comprometida com a ordem imperante, tivesse feito qualquer referência. Os famélicos sempre metem medo. A crise alimentar é de tal envergadura, associada aos transtornos advindos das mudanças climáticas, que nos é permitido falar da urgência de uma revolução. Esta palavra foi usada no dia 2 de fevereiro de 2007, em Paris, pelo ex-presidente francês Chirac ao ouvir os resultados alarmantes sobre o aquecimento global.
Advertia ele que, face à atual situação, devemos tomar a palavra revolução, no seu sentido mais literal. É urgente fazer mudanças radicais nas formas de produção e de consumo, se quisermos nos salvar e preservar a vida em nosso Planeta. Desta vez, não podemos fazer economia de revolução. Há implementá-la já agora.
Evidentemente, não se trata de revolução no sentido da utilização de violência, mas no sentido que lhe conferiu nosso historiador Caio Prado Jr.: "Transformações capazes de estruturar a vida de todo um sistema social de maneira consentânea com as necessidades mais profundas e gerais de suas populações, algo que confere um novo rumo às vidas humanas".
Pois é isso que está se impondo em nível mundial. A Organização Mundial do Comércio, o Banco Mundial, o Fundo Monetário Internacional e a maioria dos governos implantaram um tipo de industrialização da agricultura com a liberalização dos mercados que se regem pela competição e pela especulação, que acabaram por afetar a soberania alimentar da maioria dos países no mundo. É ilusão pensar que aqueles que produziram a crise têm a chave de sua solução.
Eles propõem mais do mesmo: mais produção, mais fertilizantes, mais transgênicos, mais mercado não para saciar a fome, mas para fazer mais dinheiro. Ninguém pensa em colocar mais dinheiro na mãos dos famintos para poderem comprar comida e sobreviver. Podem morrer de fome diante de uma mesa farta à qual não tem acesso. A solução se encontra nas mãos daqueles que no mundo inteiro garantem grande parte do suprimento alimentar: a agricultura familiar e as pequenas cooperativas populares.
A agricultura familiar no Brasil representa 70% dos alimentos que chegam à mesa. Ela é responsável por 67% do feijão, 89% da mandioca, 70% dos frangos, 60% dos suínos, 56% dos laticínios, 69% da alface e 75% da cebola. Esses pequenos agricultores, articulados entre si e também em nível internacional, devem formular as políticas de produção, privilegiar os mercados locais e regionais e manter, sob vigilância, os mercados mundiais para inibir a especulação e impedir a formação de oligopólios.
Esse tipo de agricultura aproveita os conhecimentos ancestrais, sabe preservar os solos e enriquecer sua fertilidade com nutrientes naturais. O Brasil, ao lado do agronegócio, tem que privilegiar a agricultura familiar, pois ela tem condições de garantir nossa soberania alimentar e de ser a mesa posta para as fomes do mundo inteiro. |
| Fonte: Jornal O Povo |
| Última atualização: 01/08/2008 às 16:42:00 |
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