Há seis anos à frente do Banco do Nordeste, o economista Roberto Smith destaca nesta entrevista a evolução do microcrédito na economia e a nova política de desenvolvimento produtivo do BNB
O Fórum BNB de Desenvolvimento tem como tema geral ´Microfinanças e PMEs no Desenvolvimento Regional´. Há intenção do banco em priorizar essas ações?
Nós somos um banco de desenvolvimento e, dentre as linhas de financiamento, o Crediamigo vem evoluindo muito com o acoplamento às políticas governamentais, facilitando a inclusão social e a bancarização. Nós entendemos como algo muito importante o microcrédito orientado, como meio de atender numa maior escala as pequenas e médias empresas, que representam 93% do total de empresas no País.
Qual a participação do crédito em relação ao PIB (Produto Interno Bruto)?
Essa relação é muito baixa no Brasil e mais baixa ainda no Nordeste, que detém os piores indicadores em termos de renda per capita e pobreza. O Crediamigo gera desenvolvimento na economia e introduz os segmentos de menor renda nesse processo. Os dez anos do Crediamigo são um marco, comprovado por pesquisa do FGV, que apontou que ele é sustentável, em termos econômicos, crescente de retorno, e com uma taxa de inadimplência inferior a 1%.
A Política de Desenvolvimento Produtivo (PDP) e o Nordeste — um dos painéis do Fórum — engloba quatro metas principais, a serem atingidas até 2010: ampliar o investimento fixo em relação ao Produto Interno Bruto (PIB) para 21%, elevar o gasto privado em pesquisa para 0,65%, ampliar para 1,25% a participação do Brasil no comércio internacional e dinamizar as micro e pequenas empresas exportadoras. Como o Banco se insere neste contexto?
Na verdade, a Política de Desenvolvimento Produtivo teve seu nascedouro no Banco do Nordeste. Hoje, o Banco tem forte presença na região, sendo o segundo em saldo de crédito (o primeiro é o Banco do Brasil). Dentro dessa política, aplicamos no Nordeste, de julho de 2007 a junho de 2008, recursos superiores a R$ 10 bilhões, dos quais R$ 7 bilhões são do FNE (Fundo Constitucional de Financiamento do Nordeste), devendo fechar o ano com uma cifra de R$ 11 bilhões a R$ 12 bilhões. Outra preocupação do banco é o acompanhamento dos avanços tecnológicos, haja visto estarem sendo direcionados à pesquisa R$ 20 milhões, somente este ano. As operações de exportações envolvem todas as empresas, embora a nossa participação no mercado externo tenha restrições decorrentes da valorização do real. Mas, há um esforço do banco de ampliar o crédito destinado àquelas empresas que começam a operar atividades do mercado internacional.
E as aplicações no mercado de capital?
Existe algo muito importante que faz parte do PDP que é a criação do FIP (Fundo de Investimento e Participação), envolvendo capital de risco com a participação triparte do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social), Banco do Brasil e Banco do Nordeste. É um fundo que está sendo estudado e que ratifica o desenvolvimento do banco no mercado de capitais.
Que avaliação o senhor faz dos 20 anos do FNE?
A recente avaliação elaborada pelo Etene (Escritório Técnico de Estudos Econômicos do Nordeste) mostra que a geração de empregos formais nas empresas financiadas pelo FNE foi três vezes superior à criação de vagas nas empresas não financiadas pelo fundo. O banco, assim como fez com o Crediamigo, está buscando uma avaliação externa mais atualizada, que deve ser feita por uma instituição acadêmica. A expectativa é a de que a avaliação poderá trazer os aportes necessários a uma visão isenta, que seja útil e incorporada pelo banco.
CREDIAMIGO EXPANDE ATUAÇÃO: BNB quer 1 milhão de clientes
A partir do dia 1º de novembro, o Crediamigo vai expandir suas operações, chegando ao Rio de Janeiro
Atingir um milhão de clientes até 2011 é o principal desafio do Crediamigo — o programa de microcrédito produtivo orientado do Banco do Nordeste. A meta foi divulgada ontem por Stélio Gama Lyra Júnior, superintendente de Microfinanças e Programas Especiais do da instituição, durante o Fórum BNB de Desenvolvimento e XII Encontro Regional de Economia, que acontecem até hoje, no Passaré. A partir do dia 1º de novembro, o Crediamigo, vai expandir suas operações para além do Nordeste, chegando ao Rio de Janeiro. Stélio relatou que o BNB está em processo de negociação com entidades que já operam microcrédito naquele município. A intenção é começar a operar o Programa em comunidades como Rocinha, Maré e Rio das Pedras, alcançando cerca de 30 mil clientes em cinco anos.
Pelo convênio, o BNB seria responsável pela metodologia e políticas operacionais; fornecimento de software para operacionalização; acompanhamento e gerenciamento das operações de microcrédito; fornecimento da estrutura de comunicação de TI; análise das propostas de crédito; desembolso diretamente aos clientes beneficiados; acompanhamento do desempenho do parceiro na operacionalização dos empréstimos; garantia da rede de agências do Banco, de terceiros ou correspondentes bancários; e remuneração da entidade pelas operações de microcrédito propostas/acompanhadas.
Uma década
Balanço dos dez anos do programa aponta que, no acumulado de janeiro a junho de 2008, foram realizados 453.542 empréstimos, dos quais 141 mil locados no Ceará. Nos seis primeiros meses do ano, foram aplicados R$ 462,5 milhões, sendo R$ 132 milhões no Estado. O valor médio dos empréstimos chega a R$ 1.019,94, inclusive entre os microempresários cearenses. ´O Ceará tem a maior representativa no Crediamigo, respondendo por 30% do total de empréstimos concedidos´, destacou. Somente em junho, estão na carteira ativa do banco 338 mil clientes, sendo 102 mil do Estado. O volume emprestado foi de R$ 255 milhões, dos quais R$ 72 milhões contemplaram o Ceará. O valor médio dos créditos foi de R$ 764,01.
O número de operações fechou em 3.682 por dia. Dados do BNB mostram que, no acumulado desde o que o programa foi criado (1998), atingiu 4.454.208 empréstimos num total de 849.241 clientes.
AVALIAÇÃO - NÚMEROS DO PROGRAMA
453.542 empréstimos ativos até junho
462,5 milhões de reais foram aplicados na região
1.019,4 reais é o valor médio das operações
141 mil operações foram realizadas no Ceará
132 milhões de reais emprestados no Estado
102 mil clientes compõem a carteira no Ceará
255 milhões de reais é a carteira ativa total
Fonte: BNB
A OPINIÃO DO ESPECIALISTA
Reconhecimento
Marcelo Nery
Economista da Fundação Getúlio Vargas
A expansão do Crediamigo pode ser comparada a um garoto que acha uma moeda — fica surpreso; é como descobrir riqueza na pobreza. Me surpreendeu o estudo que fiz onde pude constatar que os clientes do programa conseguiram crescer seu faturamento em 28%, em 35% o consumo da família e gerar um lucro de R$ 50/ano. Dez anos é tempo de sustentabilidade, fase de ser conhecido e reconhecido. É importante ressaltar que segue uma política pública diferente, porque não pesa nos cofres públicos. É como no diagrama de Pareto, todos ganham. Nós somos entusiastas do Crediamigo porque gera uma mudança na vida das pessoas. O mundo está passando por um momento de deslocamento de tecnologia, onde os países pobres estão exportando experiência de crédito para as nações ricas. É o que ocorre com o programa do BNB, que está entrando nas favelas do Rio de Janeiro. Pasmem! O Nordeste está exportando política pública, sem ônus para o Tesouro. Estamos diante de um programa que consegue conciliar o lado social com o econômico. A tecnologia de crédito solidário é nova, nasceu há cerca de 31 anos em Bangladesh, mas 65% do crédito nacional está no Nordeste. Quatro pontos do Crediamigo merecem ser destacados: o aspecto urbano; aval solidário; sustentabilidade; retorno privado dos clientes; combate à pobreza; e foco e retorno das mulheres. Mas, o desafio é combater a pobreza. Para isso é preciso estrutura relações, somar esforços, dividir informações e caminhos como os programas sociais existentes, como o Bolsa Família.
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