Sofia Lerche Vieira
sofialerche@gmail.com
Professora da Uece e da Universidade Nove de Julho; pesquisadora do CNPq
Para além dos escândalos de corrupção que assombram o planalto central, outros fantasmas rondam a capital federal. A DRU é um deles. O cidadão comum pode até não saber o que significa esta pequena e tão falada sigla, objeto de negociação entre partidos políticos e assunto de iniciados no Orçamento Público. Respondendo pelo nome de Desvinculação das Receitas da União, a DRU é assunto que interessa a todos e, mais uma vez, ameaça o dia a dia das políticas que dependem de recursos federais, caso específico da Saúde e da Educação.
Quem acompanha as chamadas pautas-bombas recentes do Congresso, votadas a toque de caixa e na calada da noite, talvez tenha notado que a DRU está na agenda dos temas prioritários em tramitação no Congresso e acaba de ser aprovada em segundo turno na Câmara. O presidente interino tem enfatizado que sua aprovação não irá afetar as chamadas receitas vinculadas. Não? Difícil acreditar. Embora assim esperem os defensores das políticas sociais bancadas com receitas vinculadas. Mas, afinal, o que são receitas vinculadas?
As chamadas receitas vinculadas são aquelas asseguradas constitucionalmente que contam com recursos do Poder Público para sua manutenção. À União cabe aplicar pelo menos 18% de sua receita resultante de impostos em educação e 15% de sua receita corrente líquida em saúde. A Desvinculação das Receitas da União (DRU), na prática, concede ao governo federal maior liberdade na aplicação de seus recursos, que passa a poder usá-los em áreas não previstas em lei. É justamente aí que mora o perigo! Não há garantia de que a desvinculação assegure o bom gerenciamento dos recursos.
Os problemas acumulados na saúde e na educação são muitos e se tornam mais agudos em tempos de crise. Infraestrutura precária, colapso de serviços, greves e ocupações ameaçam o frágil equilíbrio dos serviços prestados pelos governos. A questão é complexa e merece ser aprofundada.
Se, perdidos nos ralos da corrupção e da ineficiência, recursos não chegam onde devem, cortes lineares não resolvem. Podem agravar e afetar de forma dramática quem mais precisa desses serviços: o cidadão comum, sem condições materiais de comprar serviços privados. É dever do Estado salvaguardar seus direitos e interesses. Não por acaso tende a tornar-se verdadeira uma frase popular nesses tempos temerosos e incertos: “E no fundo do poço tem um alçapão”. Esse fantasma, preferimos não ver.
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