O presidente do Banco do Nordeste do Brasil (BNB), Marcos Holanda, disse ao O POVO que não acredita que haverá cortes no Fundo Constitucional de Desenvolvimento do Nordeste (FNE). Apesar de ser apenas a opinião dele, já que o Projeto de Emenda Constitucional (PEC) nº 87 prevê corte de 30% nos repasses aos fundos constitucionais, argumenta com aparente tranquilidade sobre o assunto. O presidente participou do Programa Vertical S/A, que vai ao ar hoje às 22h na TV O POVO.
Os recursos do FNE são considerados o “oxigênio” do Nordeste, em termos de recursos de médio e longo prazo ao setor produtivo da Região - representam cerca de 70% do total do que é disponibilizado. Além disso, é cerca de metade de tudo que o banco empresta por ano e significa cerca de R$ 13,5 bilhões.
“O FNE é um ativo que o BNB conquistou a duras custas e tem que ser preservado. O papel do banco é mostrar que estamos fazendo o nosso dever de casa em termos de aplicar o FNE. A classe política e empresarial têm que ser muito altivo e muito firme para dizer que o Nordeste não considera essa hipótese de perder isso”, complementou após a gravação do programa.
O BNB vai criar um novo cargo: economista-chefe. Ele irá comandar o Escritório Técnico de Estudos Econômicos do Nordeste (Etene). A escolha do titular o cargo será por meio de seleção pública, que inclui anúncio, avaliação de currículo e escolha pelo Conselho de Administração do banco. O cargo já foi aprovado pelo Governo Federal, conforme Marcos Holanda, com o aval do ministro da Fazenda, Joaquim Levy.
Além disso, o Etene terá também um concurso para 20 vagas de mestres e doutores, independente da profissão do candidato. Um dos critérios do edital será ter e demonstrar conhecimentos e aptidões em desenvolvimento econômico. A previsão é para ser lançado ainda este ano. Os salários serão equivalentes ao salário de um professor-doutor na universidade, no entanto, mais competitivo. A carga horária é menor e não tem dedicação exclusiva.
Corte no FNE
Tem que estar preocupado com a eficiência e efetividade dele. Tem que estar sempre pronto para mostrar que se justifica. O gasto público tem que ser um gasto de qualidade, um gasto que mostre diariamente que o retorno para a população acontece. Quando surge algum movimento desse tipo (contrário ao FNE), algum questionamento se o Nordeste tem ou não capacidade de atrair esses empreendimentos produtivos, nós temos que estar preparados para dizer: sim, os fundos constitucionais estão sendo trabalhados com a preocupação de gestão que deve caracterizar o uso dos recursos públicos. Estratégia que eu tenho colocado para o Banco do Nordeste. Seu principal foco é trabalhar bem feito o FNE. Isso tem que ser uma obrigação diária. Se fizermos isso de forma satisfatória, nós estaremos preparados para qualquer discussão, para qualquer contraditório, qualquer provocação. O Banco do Nordeste, acima de qualquer coisa, tem que ter essa missão: fazer o FNE bem feito. De acordo com três “es”. Eficácia. Ou seja, desembolsar o FNE, colocar o FNE no setor agrícola, da média e pequena empresa, nas grandes empresas, distribuir geograficamente esses recursos. Eficiência, ter uma estrutura enxuta, que maximiza esse potencial de aplicar o FNE. A sociedade cobra uma estrutura eficiente. Hoje, a dona de casa e o empresário estão fazendo o esforço para fazer mais com menos. Efetividade. O que foi desembolsado chegue lá e torne a empresa mais produtiva, torne o agricultor mais produtor, aumente a renda do micro e pequeno empresário. E o quarto “e” é a ética. Tem que ser feito com muita ética e integridade. É a estratégia que tenho colocado muito claro, muito objetiva para o banco. Não como uma cobrança, mas como postura que, se fizer isso, o banco está preparado para qualquer discussão. Não abrimos mão de ser o operador único do FNE, por uma causa muito simples. Estamos fazendo nosso papel. Não tem porque a gente abrir ao debate de uma possível parceria.
Movimento pró-FNE
Tem pessoas importantes, como o Firmo de Castro (economista), que tiveram papel importante no FNE. A própria bancada federal tem se mobilizado. O líder da bancada (do Nordeste), deputado Júlio Cézar (PSD), já tem colocado essa defesa do FNE. Semana que vem, devo estar indo ao Senado, se não me engano, para uma discussão sobre o FNE. O que eu tenho colocado é que nós vamos lá e vamos mostrar que essa agenda não é contra a gente. Vamos tomar proveito dessa agenda e mostrar que o FNE é bem financiado. Tem espaço para melhoria? Sim, sempre tem. O FNE é essencial para o Nordeste.
CONCURSO
Teremos um concurso para o Etene. Minha meta é até o final do ano. Seriam 20 vagas. Concurso com um salário competitivo, para atrair doutores. Um salário que um professor doutor tem na universidade. Com o atrativo do ambiente de pesquisa e a toda infraestrutura do Banco do Nordeste. Não vai ser limitado a carreiras específicas. No mundo de hoje, as carreiras são mais tênues... o relevante são as capacidades. Se é engenheiro, agrônomo, arquiteto, médico... para mim, não importa. O que importa é que conheça desenvolvimento econômico, saiba qual é o papel de um banco de desenvolvimento e que mostre isso na hora da prova. Estamos em fase final. Temos autorização do Dest (Departamento de Controle das Estatais). Está bem próximo de soltar os editais.
Economista-chefe
Vamos criar a figura do economista-chefe do Banco do Nordeste. Todo banco de desenvolvimento grande tem o líder focado em gerar inteligência econômica. É uma decisão já tomada, com apoio do próprio ministro (da Fazenda, Joaquim Levy). Vamos, eventualmente, ter que fazer uma reforma no estatuto do banco, porque a figura do economista-chefe deve está aberto não só a funcionários do banco. O processo é de chamada pública. Vamos anunciar que existe o cargo, com o salário, qualificação e o que se espera dele. Anúncio não só no Brasil como no exterior. Ao longo de um mês, deixa esse anúncio publicado. Recebe os currículos dos candidatos. Internamente, faz uma seleção. Esse nome é submetido ao Conselho de Administração, que aprova a nomeação. Minha expectativa é que, até o final do ano, já temos a nomeação do economista-chefe. Vai ser o chefe do Etente, vai liderar o Etene. Isso vai casar com o momento da oxigenação do Etene com esse novo concurso. A gente acha que vai dar uma valorização muito boa ao Etene e ao Banco do Nordeste.
Pé no freio
Nesse cenário (de crise), as empresas ficam mais conservadoras, mais criteriosas, o que é bom para elas e bom para o banco. O banco não tem interesse de projetos com aspectos técnicos questionáveis. Agora, o FNE, na sua essência, é uma fonte de recursos de médio e longo prazo. As decisões de médio e longo prazo tem algum afetamento no curto prazo, mas não são tomadas só olhando no curtíssimo prazo. Temos uma demanda ainda robusta na carteira de projetos. O banco tem hoje o FNE em termos de recursos, aportam um número de recursos de crédito significativo. Algo em torno de R$ 14 bilhões por ano. Uma coisa importante é que, nessa carteira de empréstimo do Banco do Nordeste, os recursos que estão retornando de empréstimos anteriores já superiores aos recursos que entram todo ano por conta das transferências constitucionais, o que mostra a vitalidade do fundo de se autofinanciar. Eu diria que nós temos recursos suficientes para atender as demandas da região, principalmente, quando se tem bons projetos.
Expansão de agências
A capilaridade funciona e se justifica desde que seja nessa lógica do banco de ser um agente do FNE. Capilaridade facilitar a ação do banco na sua parte de FNE é bem-vinda e fortalecida. Na lógica puramente comercial é questionável. O mundo de hoje é muito competitivo, demanda muita especialidade, muita capacidade. As instituições não devem perder essa perspectiva do seu foco. Tem que ter uma lógica maior que ali eu sou muito forte, ali eu sou competitivo. O banco tem que ter o seu foco. Até porque o debate, a provocação em relação ao FNE vai ser cada vez maior. Nossa estrutura tem que ser capitaneada na lógica do FNE. Aquilo que der suporte ao FNE vai ser fortalecida. Mas o banco tem que perceber qual sua estratégia maior. Tem uma frase do líder republicano do senado norte-americano, Mitch McConnell, que diz que a palavra mais bonita do dicionário americano é “foco”. Mais bonita e mais importante. Eu concordo com ele.
Fim da expansão
Já está praticamente concluído. Expansão significativa. A fase agora é menos de questionar a expansão ou não. Entender essa expansão e cobrar resultados dessa expansão. A minha preocupação é que as agências se justifiquem. Tudo no banco tem que se na lógica: nós estamos agregando valor à região? Tem que estar sempre respondendo a essa pergunta. A fase nossa agora é essa. Essa avaliação crítica. As instituições sempre tem que ter a postura da autocrítica. Tem que ser forte dentro para serem fortes fora.
Onde estão os talentos?
Essa característica de formar quadro, de melhor entender a região, de gerar inteligência econômica e social é a diferença de um banco de desenvolvimento. Se não tiver isso, está muito fragilizado. Vira um banco comercial. O Banco do Nordeste tem a lógica do lucro, tem a lógica da sustentabilidade financeira. Mas não pode ser um simples maximizador de lucro. Tem que ser mais um maximizador de impacto para a Região. Temos duas medidas muito claras nessa direção.
Microempresas
A lógica do banco é menos de ficar preocupado com grande, média ou pequena. Tem que se preocupar com valor agregado. Onde tem valor agregado, o banco tem que estar presente. A micro e pequena é um cliente importante para o banco em uma região onde o empreendedorismo é fundamental. O desenvolvimento do Nordeste necessariamente passa pelo empreendedorismo do micro e pequeno. Mas também pela média. Também pela grande. Quando o banco apoia um grande empreendimento, ele percebe que ali tem uma âncora que puxa uma cadeia de valor que chega até o micro e pequeno.
Eólicas
Toda eólica tem uma história intrinsecamente ligada ao Bando do Nordeste. (O BNB) Deixou (de financiar), mas isso talvez em um contexto específico em que você avançou demais em projetos em termos de capacidade do banco de financiar. Mas o banco não tem porque não está presente nessa cadeira de geração de valor que hoje estamos percebendo na eólica. Nordeste já fabrica pá e até as turbinas. É importante, como é importante esse setor novo que é a solar. Então, o banco tem que está muito presente em não subestimar o potencial de mercado que isso possa evoluir. O foco do banco é muito mais de agregar valor do que da lógica segmentada. Então a micro e pequena tem um espaço importante. Mas eu tenho colocado também que a média empresa é um setor que a gente não pode deixar de atender, até porque, enquanto banco de desenvolvimento, o verdadeiro sucesso é quando consegue transformar uma micro em uma pequena e uma pequena em média. É aí que você mostra que é capaz de agregar valor a essa Região. É mais olhar agregação de valor do que o tamanho da empresa em si.
Você tem que olhar o que chama externalidade. O parque eólico em si não gera muito emprego. Na medida em que fomenta a cadeira de geração de valor daquele setor, isso começa a agregar valor e consegue a perceber que se justifica o investimento naquele setor.
Banco além-Ceará
Fui ao Piauí, Bahia, São Paulo, fóruns de governadores. Vamos aos fatos. O maior tomador de empréstimos do Banco do Nordeste é a Bahia, dentro da representatividade da economia. Depois vem o Ceará, depois Pernambuco. Estive lá no Piauí. Em junho, o estado que mais contratou FNE no Nordeste foi o Piauí. O banco tem uma distribuição geográfica das suas contratações bem equilibrado. O fato da sede está aqui não cria essa marca de banco do Ceará. Essa preocupação está presente, porque o banco é da Região.
Governança
Óbvio que esses acontecimentos tiveram sérias consequências para a Região e para o banco. Mas que mais sofreu foi o próprio funcionário do Banco do Nordeste, que não se via naquilo. As pessoas diziam: “Aqui não é o Banco do Nordeste.” É uma coisa totalmente fora da curva, que a gente tem que enfrentar com muita firmeza, independência e Justiça. A gente está numa fase de fortalecer a governança do banco. Temos enfrentado isso de forma muito firme. A liderança do banco, a figura do presidente, tem que está muito clara, muito objetiva nesse sentido. Aqui não existe margem para manobra, para flexibilização. Integridade, como diria o professor Simonsen (Mário Henrique, economista) “integridade é que nem gravidez, ou tem ou não tem.” Não tem meio termo. Nessa coisa da ética e da integridade é algo que a presidente não abre mão e se sente confortável, porque sabe que o funcionário do Banco do Nordeste concorda e apoia de forma integral. Não quer dizer que o banco está imune a um ou outro desvio de conduta. Sempre vai existir. Mas, se apurada, vai ser corrigida de forma mais forte possível. E o banco está nesse processo de aprimoramento. Tem que estar firme, mas pronto para fazer as correções que forem necessárias. Ainda está no processo normal de apuração. Está em andamento. Importante aí é identificar quem falhou, quem fez o malfeito, e punir de forma mais exemplar possível e preservar quem não teve a má conduta. Lembrando que a atividade do banco é uma atividade de risco. Aquilo que foi feito de forma criminosa deve ser punido exemplarmente.
Presidente liberal
Se liberal for, antes de mais nada, ter a lógica, primeiro que os recursos são escassos. Se os recursos são escassos, todo economista, todo gestor, tem que entender que, quando atende A, deixa de atender a B ou atende B de forma menor. Então, a escassez sempre leva a questão de priorização. Não pode fugir dessa responsabilidade. E tem que priorizar aqueles que mais precisam. Então ser liberal é exercer essa prática de priorização e sempre na lógica de quem mais precisa e não de quem mais se representa politicamente. Por outro lado, ser liberal – não ser se é ser liberal -, antes de entrar no debate do tamanho do governo, é entrar no debate da qualidade do governo. Para mim, não importa se o governo é grande ou pequeno. Importante um governo que funciona. O Brasil não pode abrir mão de governo que não funcione bem. Se é grande ou pequeno, é irrelevante. Se o serviço público é de qualidade, isso é ser liberal. Ser liberal também é entender que as pessoas respondem aos incentivos. Quando as coisas não funcionam é porque os incentivos não estão corretos. Você simplesmente transferir recursos sem cobrar qualidade qualquer tipo de justificativa em termos de qualidade da aplicação dos recursos você não está fazendo seu papel enquanto economista. Se isso for liberal, eu acho que sou liberal.
Ministro FORTE
Claramente o cenário político é um tanto confuso e desafiador, mas vejo o ministro, e o próprio ministério, muito mais forte do que fraco. Um ministro que tem a postura e está disposto a enfrentar desafios, certamente é um ministro forte. Jamais um ministro fraco teria a capacidade de colocar na mesa e enfrentar problemas estruturais que o Brasil tem tido nos últimos anos. Acho que essa capacidade mostra uma fortaleza. O ministro está colocando temas que são sensíveis. Não é de forma alguma contra o crédito de exportação, mas questionou a forma está sendo feito. Questionou o papel do BNDES, em termos de readaptação das taxas de juros, realinhamento de preços públicos. Então a capacidade e a determinação com que ele tem enfrentado problemas estruturais da economia, na minha visão, mostra que ele é um ministro forte. Não se abstém e não hesita em colocar o Brasil em colocar medidas estruturais que o Brasil tem que fazer. Não é questão de “se”, é questão de “quando”. Porque, se não fizer, realmente, o Brasil perde o bonde da história.
Impacto do ajuste fiscal
Claro que a Região sente. No crescimento, ele entre por último. Quando o País cai, o Nordeste cai atrás também. O comércio e serviço, acostumados com crescimento altíssimos, sentem mais.
Proveito da exportação
O Nordeste criou um colchão de atividade econômica, a partir de 2008, que foi toda essa rede de proteção social. Você gerou um crédito para uma população que não tinha crédito. Agora não dá mais para se endividar. O Brasil não tem mais como não abrir a sua economia. É um dos países mais fechados do mundo. Não se inventa a roda. A indústria automobilística do México deveria ser metade da do Brasil. Hoje é quase o dobro. As indústrias estão indo para o México porque têm acordos bilaterais e produzindo lá consegue exportar. O Nordeste pode tirar proveito, porque tem uma situação privilegiada. Podemos ter um perfil de plataforma de exportações importantes. A abertura da economia do Brasil vai ser melhor para o Nordeste do que para o resto do País.
Unificação da alíquota do ICMS
Os estados perderiam potencialmente como instrumento de política fiscal. Mas os estados têm que investir na lógica alternativa do incentivo fiscal. Não necessariamente, ele tem que ser concedido via um tributo específico. Incentivo fiscal é basicamente o uso do seu orçamento fiscal para políticas públicas. Uma coisa é eu atrair a indústria dando um desconto no tributo que ele tem que pagar. A outra coisa é eu cobrar o tributo cheiro, mas, no meu orçamento, eu vou criar uma linha de crédito para capacitação da mão de obra daquela indústria. Hoje elas (empresas) estão mais realistas. Se essa reforma do ICMS que está sendo trabalhada realmente sair com fontes críveis de financiamento, não deixa de ser uma forma de atrair empresas para a Região. As empresas estão fugindo de incertezas. Esses mecanismos de incentivos fiscais, queira ou não queira, têm uma incerteza jurídica que ainda é forte. É uma fase que os estados do Nordeste vão vencer. O incentivo fiscal sempre vai existir.
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