O Banco do Nordeste do Brasil (BNB) investiu milhões de reais na construção de um presídio em Pernambuco, enquanto milhares de agricultores do Ceará são sufocados pela cobrança de dívidas e vêem propriedades rurais indo a leilão para quitar débitos com a instituição.
A obra do presídio, orçada em R$ 287 milhões, já consumiu R$ 350 milhões e tem dívidas trabalhistas e com fornecedores superiores a R$ 100 milhões.
O governador de Pernambuco, Eduardo Campos (PSB), responsabiliza o BNB, em entrevista aoJornal Folha de São Paulo, edição desta sexta-feira (10/01), pela falta de fiscalização na construção do presídio, que seria feito no modelo de PPP (Parceria público-privada).
Acusado de abandonar o projeto, Campos disse que o Estado de Pernambuco não gastou um só centavo com a construção do presídio e acusou o BNB de não fiscalizar a obra. Sem sair do papel, o presídio é uma obra fantasma por não se transformar em realidade.
Matéria da Folha de São Paulo:
http://www1.folha.uol.com.br/poder/2014/01/1395696-projeto-de-eduardo-campos-esta-parado-ha-dois-anos.shtml
10/01/2014 - 03h16
Projeto de Eduardo Campos está parado há dois anos
REYNALDO TUROLLO JR.
DO RECIFE
A obra anunciada como vitrine das parcerias público-privadas da gestão de Eduardo Campos (PSB) em Pernambuco está parada, tem falhas estruturais graves e deverá custar o dobro do previsto.
O presídio de Itaquitinga, na zona da mata pernambucana, começou a ser erguido em 2009, sob o título de "maior e mais completa PPP [parceria público-privada] prisional do Brasil". A previsão de conclusão era 2011.
A unidade deveria receber 3.126 presos. O canteiro de obras, contudo, está às moscas desde 2012. O governo afirma não ter colocado dinheiro público no local e culpa a construtora e o BNB-financiador do projeto- pelos problemas.
Por três semanas, a Folha entrevistou fornecedores e prestadores de serviço da obra. Eles pediram anonimato, sob justificativa de temerem eventuais retaliações. De fornecedores de equipamentos de segurança a refeições, dezenas de empresários estão sem receber da construtora Advance, que era responsável pela obra e faliu.
A obra também utilizou materiais diferentes do que o projeto previa. O piso interno é cinco vezes mais barato, e o chão dos banheiros das celas do primeiro andar não foi impermeabilizado. Na parte externa, a grade que isola o presídio tem metade da espessura prevista, podendo ser rompida e escalada -profissionais da obra batizaram a estrutura de "alambrado de galinheiro".
Os problemas expõem uma das fragilidades da PPP de Campos: ausência de fiscalização pública durante a execução do projeto. Pelo contrato, o consórcio vencedor deveria construir e entregar a unidade para poder administrá-la por 33 anos. A empresa passaria a receber do Estado somente após a chegada dos presos.
Orçado em R$ 287 milhões, o presídio já custou cerca de R$ 350 milhões e deixou em torno de R$ 100 milhões de dívidas trabalhistas e com fornecedores. E, para ficar pronto, precisará de mais R$ 120 milhões, segundo o arquiteto César Ferrage, responsável pelo projeto. Com isso, o custo da obra pode bater em R$ 570 milhões, o dobro do orçado.
Governo e Advance não sabem de onde tirar o dinheiro que falta. Não se sabe também se, pelo custo extra, o governo pernambucano terá de dar remuneração adicional à empresa durante a operação da unidade.
A gestão Campos teme uso eleitoral do caso, mas nega que o problema afete outras parcerias. Pernambuco tem mais duas PPPs contratadas: a da arena da Copa, de R$ 464 milhões, e a do complexo viário da praia do Paiva (R$ 73 milhões, 33 anos).
OUTRO LADO
O governador Eduardo Campos disse que não investiu dinheiro público no presídio em Itaquitinga e que a fiscalização cabia ao BNB (Banco do Nordeste do Brasil), controlado pela União.
"Nenhum real será colocado se o equipamento não for entregue nos conformes pelo empreendedor e pelo banco, que foi quem colocou recursos. Na verdade, ao Estado caberia fiscalizar ao receber a obra. O dinheiro lá é do Banco do Nordeste", afirmou.
Para fornecedores e prestadores de serviço, porém, o Estado funcionava como "fiador" da obra e agora cobram medidas do governo estadual. O governo de Pernambuco nega. "O governo é contratante da PPP, mas não é fiador das obrigações contraídas pelo concessionário", disse o procurador-geral do Estado, Thiago Norões.
Norões disse que, se o concessionário não terminá-la, o governo terá de declarar a caducidade do contrato. "Só que o BNB tem preferência [para receber]". Representantes da Advance não foram localizados pela reportagem. O BNB informou ter feito fiscalizações trimestrais no local: "Não foi detectado uso de material diferente do especificado no projeto original".
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