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01/07/2009

Nossa Voz - Trabalho: promotor de saúde ou doença?

Menos gente, mais trabalho; mais cobrança, menos saúde

De acordo com a Confederação Nacional dos Trabalhadores do Ramo Financeiro (Contraf), no início da década de 90 – há menos de 20 anos – existiam no Brasil cerca de 800 mil bancários. Hoje, com as inúmeras fusões e o avanço tecnológico, esse número caiu quase pela metade: são 440 mil trabalhadores. Para Plínio Pavão, Diretor de Saúde da Contraf, esse número mostra que agora é menos gente para dar conta de mais serviço. “Eu posso até admitir que as novas tecnologias diminuíram o trabalho do bancário, digamos, naquilo que era tradicional como a compensação. Mas se você observar bem verá que a redução de postos de trabalho não é compatível com a redução da carga real de trabalho”, afirma.

As doenças advêm de uma combinação de fatores: some-se à redução dos postos a toda uma reestruturação produtiva, de precarização do trabalho, e a uma ideologia dominante que prega a competitividade e o individualismo. Sob essa ótica, a pessoa que está ao seu lado é seu adversário; é você quem deve dar o sangue para garantir o emprego e há uma distorção no trabalho, passando o bancário a ser um vendedor. “Parece a história do pote de ouro no fim do arco-íris. Quando o bancário pensa que atingiu a meta, ela dobra. Aí a pessoa se vê obrigada a vender título no churrasco de fim de semana para a família, na hora do lazer, pra tentar garantir o emprego, o que é um absurdo”, acrescenta Plínio Pavão.

Saúde no BNB – O Nossa Voz não obteve do Banco do Nordeste o número de funcionários que estão hoje afastados por doença, muito menos os motivos específicos do afastamento. Tal informação é de extrema relevância para se ter idéia de como está a saúde do trabalhador do BNB e sobretudo para traçar estratégias conjuntas que solucionem o problema a partir de suas causas. O que obtivemos de informação se refere aos programas desenvolvidos pela Célula de Saúde e Qualidade e Vida, que integra o Ambiente de Gestão de Pessoas. O setor  coordena todas as atividades e programas relacionados ao assunto no BNB, e em breve passará a se chamar Célula de Saúde, Segurança do Trabalho e Qualidade de Vida.

Atualmente, o principal programa desenvolvido pelo BNB é o Programa de Controle Médico de Saúde Ocupacional (PCMSO) – que é obrigatório, pela legislação vigente – e responde pelo acompanhamento dos exames periódicos e os afastamentos pelo INSS. Outros programas de prevenção, como o Saúde 100% e o Programa de Melhoria da Qualidade de Vida, surgiram como conseqüência do PCMSO e hoje há um esforço no sentido de envolver todo o Banco.

Para a execução das atividades de prevenção, como ginástica laboral e massoterapia, são contratadas empresas nas capitais e segundo Lidiane Dutra da Silva, gerente da Célula de Saúde, as unidades que ainda não dispõem da atividade é devido à falta de profissionais na região, problema que o Banco tem buscado solucionar contratando pessoas de localidades próximas. “O programa de prevenção está passando por uma revisão. Estamos buscando a diversificação das atividades e sua  descentra-lização”, informou.

A célula é composta por médico do trabalho, engenheiro de segurança do trabalho, técnico do trabalho, enfermeiro ligado à Camed e consultores – alguns formados em psicologia. O quadro limitado de profissionais inviabiliza o acompanhamento a quem está afastado. “A gente sabe que está trabalhando com pessoas em situação de vulnerabilidade, mas infelizmente não temos quadro suficiente para um acompanhamento para além das demandas administrativas”, admite a gerente da Célula. Segundo ela, o acompanhamento se dá na medida do possível e se restringe normalmente à orientação para o afastamento e para a renovação da licença. “Não é acompanhamento personalizado porque não há profissionais para isso”, afirma.

E não há mesmo. A funcionária Rosa de Lurdes Damasceno ficou afastada durante cinco anos devido a uma neoplasia maligna. Nesse período não recebeu uma ligação sequer, uma visita de um profissional, seja do Banco seja da Camed. “Não fosse pelos profissionais do Hospital do Câncer eu não teria tido nenhum tipo de acompanhamento psicológico, o que é necessário porque quando você passa por isso precisa de apoio”, afirma. Rosa lembra que quando teve sua primeira filha, um ano após entrar no Banco, em 1984, recebeu a visita de uma funcionária da Camed para verificar seu estado de saúde e se ela precisava de algo.

Para Rosa, há empenho do Banco quando este é procurado pelo funcionário, mas não há nada “de lá pra cá”. “Acho que existe muita burocracia. Se eu tenho uma relação de funcionários afastados, tinha que ter uma pessoa designada para acompanhá-los”. Ela cita ainda o problema da desorganização. Mesmo após retornar ao trabalho, ainda constava como afastada e até agora – mais de um mês depois de seu retorno – não tem lotação definida, o que causa certa ansiedade. “O discurso do Banco é muito voltado para as pessoas, para a humanização do trabalho, mas na prática ainda está muito longe disso”, aponta.

O retorno também foi sofrido. Devido ao esvaziamento axilar, procedimento resultante do tratamento, ficou com algumas limitações motoras e está na terceira reabilitação no Banco. Nas duas anteriores, frustradas, chegou a ficar deprimida. “Eu tinha muita resistência em voltar. Fiquei com resquícios da gestão de Byron, meio traumatizada. Tinha a sensação de que não pertencia mais ao Banco”, explica Rosa. Dessa vez, a reabilitação é diferente. “Estou no Ambiente de Gestão de Pessoas, ainda me familiarizando, sendo reintegrada passo a passo”.
Quem sofre de algum distúrbio de comportamento, então, enfrenta mais desafios, a exemplo do preconceito e da estig-matização. Além disso, o afastamento das atividades e do convívio com os colegas por vezes agrava o quadro, uma vez que se sentem abandonados pela empresa para a qual muitas vezes dedicaram anos de sua vida. Nadja Lourença, afastada há dois anos, sabe bem o que é isso. “Eu acho que o Banco tinha que ter uma assistente social para acompanhar os afastados. Além disso, o médico do Banco tinha que dar um suporte, acompanhar de perto o trabalho dos outros médicos, o que daria mais segurança para a gente”, sugere.

A sobrecarga de trabalho somada a problemas pessoais resultaram em um quadro grave de depressão. Hoje ela diz que tem medo de voltar ao Banco. “Tenho medo da receptividade das pessoas, do preconceito, de não ter oportunidade de crescimento lá dentro e de não saber mais fazer o que fazia antes”, desabafa. Além disso, ela teme que algumas coisas que não lhe faziam bem permaneçam, como o trabalho fora do horário. A existência de uma equipe multidisciplinar para acompanhar os funcionários afastados seria de grande importância também para mediar e amenizar o retorno ao Banco. Nadja concorda. “Tem que ser feita alguma coisa, e rápido”, defende. 

Segundo Lidiane Dutra, da Célula de Saúde do BNB, está em fase de validação no Banco o Programa de Assistência ao Empregado. O programa, ainda sem previsão de implantação, irá tratar de dependência química, distúrbios psíquicos,  e dará suporte às pessoas com necessidades especiais, sempre buscando envolver a família no processo.

HISTÓRIAS DE VIDA

São vários os relatos de afastamento do Banco por problemas de saúde físicos e mentais. Em todos a mágoa da ausência de uma assistência e acompanhamento mais dirigido e humanizado.

Jane Alves Medeiros, hoje aposentada do BNB por invalidez, relatou uma história de perseguição na gestão de Byron Queiroz. “Me transferiram para Santa Inês (MA) e tiraram minha função em comissão (eu era agente de desenvolvimento). Eu havia me divorciado, e meus três filhos, ainda menores de idade, ficaram sozinhos aqui em Fortaleza, sem a mãe e sem assistência do pai”.

Ela entrou na Justiça e ganhou. “Diz a lei trabalhista que ‘se você é transferido em função de um cargo em comissão, e este lhe é tirado, você tem o direito de regressar para sua lotação/cidade anterior’. Ganhei na justiça, e retornei para Fortaleza, sub-júdice”.

Com o problema não solucionado pela atual gestão a saúde de Jane não aguentou: mente e corpo. Foi acometida de uma depressão profunda. “É claro, com tudo aquilo que me acontecia... Não sou de ferro. Depois tive um problema de saúde, com certeza desencadeado pelos desgostos pelos quais passara, que me obrigaram a me submeter a uma delicada cirurgia e a ficar de licença, pelo INSS, por dois anos”.
Após algumas idas e vindas ela se aposentou por  invalidez com pouco mais de vinte anos de Banco.

O caso de Jane mostra como um ambiente de trabalho pode interferir, no caso dela, negativamente, na saúde e como a humanização nas relações trabalhistas - sobretudo nas relações hierárquicas - ainda está longe de se concretizar.
Fica o desejo de que situações como essa não voltem a acontecer nas dependências do Banco do Nordeste, para o bem da saúde de seus trabalhadores e da própria empresa.

 

Última atualização: 30/11/-0001 às 00:00:00
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