As armas contra o assédio moral
Para aprofundar o tema assédio moral e traçar um panorama da problemática no Brasil, a Confederação Nacional dos Trabalhadores do Ramo Financeiro (Contraf-CUT) realizou, em parceria com o Sindicato dos Bancários de Pernambuco, uma pesquisa nacional junto à categoria bancária com o objetivo de informar e formar agentes multiplicadores, que possibilitem o aprofundamento do debate em torno do tema. Para isso, elaboraram uma cartilha na qual definem o fenômeno, explicitam as formas de manifestação e alertam sobre os procedimentos que devem se tomados ao se constatar o fato. Mas como diferenciar o assédio moral da cobranças típicas das relações de trabalho? Para falar sobre isso, o Nossa Voz entrevistou a coordenadora da pesquisa e diretora da Secretaria de Formação do SEEB-PE, Suzineide Medeiros.
Nossa Voz – O SEEB-PE está à frente da pesquisa nacional sobre assédio moral na categoria bancária. Qual é a principal contribuição da pesquisa e seus objetivos?
Suzineide Medeiros – Nós temos três objetivos: primeiro, diagnosticar que de fato existe assédio moral na categoria. Segundo: a gente queria conhecer elementos que comprovassem o assédio para a discussão desse tema na nossa pauta de negociação, visando incluir uma cláusula de combate ao assédio moral na nossa convenção coletiva. Por último, fazer uma mobilização para a aprovação da lei que tramita no Congresso sobre assédio moral no trabalho.
Nossa Voz – Como diferenciar assédio moral de uma cobrança natural nas relações de trabalho?
Suzineide – No trabalho, o funcionário – qualquer que seja a função – tem a obrigação de fazer e desempenhar bem o seu papel. Mas, numa situação de assédio moral, o ambiente de trabalho torna-se nocivo porque o assediador procura deses-tabilizar a pessoa. Então ele vai agredindo aquela pessoa sistematicamente, procurando motivos para humilhá-la em público, perante os colegas. Isso todo dia, de forma constante. A pessoa é boicotada no trabalho. “Sem querer” alguém vai lá e deleta seu trabalho, não dá informação correta... Todo dia vão acontecendo coisas que poderiam ser coincidência, mas se você olhar com atenção, não são. Nem sempre são atitudes grosseiras; muitas vezes são sutis.
Nossa Voz – Quando um funcionário é vítima ou presencia casos de assédio moral, o que deve fazer?
Suzineide – A primeira coisa é procurar o sindicato. Pode conversar com a família para falar do que está passando, porque o assediado às vezes adoece solitariamente, porque pensa que é o culpado daquela situação. Em alguns bancos existem as Ouvidorias, mas nem sempre o bancário tem coragem de procurar este caminho, por causa da perseguição. No assédio moral, normalmente a pessoa que assedia é o superior hierárquico. Pode acontecer entre colegas? Pode, como também do subordinado em relação ao chefe, embora nossa pesquisa tenha mostrado que 73% dos agressores são os superiores hierárquicos, ou seja, são os chefes que estão praticando. O medo é o principal fator do assédio moral – medo de perder o emprego, a promoção que podia vir, medo de ser chamado de louco, de desequilibrado. O medo é o fator que mais atrapalha e que faz com que as empresas adotem essa estratégia.
Nossa Voz – No ramo financeiro, já houve momentos em que o assédio foi coletivo, como na época de Byron Queiroz, no BNB, quando os funcionários sofreram inúmeras perseguições. Nesses casos, onde o objeto do assédio não é apenas uma pessoa, mas um grupo, o que é possível fazer?
Suzineide – No assédio coletivo a idéia é pegar o máximo de provas e colocar o Banco na justiça, porque quem deve ser responsabilizada é a empresa, não o gerente. O assediador vai responder como chefe, mas quem vai ser punido é o Banco. Tem que pegar todas as provas, testemunhas, anotar tudo, a hora em que houve o assédio, a reunião. E depois pode procurar o Ministério Público ou a Delegacia do Trabalho. Já temos algumas ações ganhas, como uma recente contra a CEF, no Rio Grande do Norte.
Nossa Voz – Com a pesquisa, quais foram os principais problemas de assédio moral identificados? Suzineide – A gente fez a pesquisa com 2.609 bancários e bancárias de 25 estados. Foi uma boa amostragem. Das 22 ações constrangedoras, as relatadas com freqüência são a quantidade de tarefas dadas pelo chefe, assim como instruções confusas e imprecisas, de propósito. Isso é grave. 38% dos bancários que responderam a pesquisa disseram que passaram, pelo menos nos últimos seis meses, por uma situação constrangedora. Onde tem havido mais reclamação é quanto às metas para vender produtos. Outro aspecto importante do assédio moral que nós descobrimos é que 60,72% da categoria se sente nervoso ou preocupado. Isso quer dizer que ir paro banco já se torna um sacrifício. Nesses casos, a maioria são mulheres. As pessoas que têm orientação sexual diferente também relatam isso.
Nossa Voz – Como acabar com essa prática nas instituições?
Suzineide – A melhor forma é capacitar a gestão de pessoas para novas práticas nas relações humanas no ambiente de trabalho. Você pode ter as metas, mas não podem ser metas impossíveis de cumprir. A gente conseguiu agora com a Fenaban, na última campanha salarial, formar um grupo de trabalho para se começar a construir os elementos para combater o assédio moral, ou seja, quais as condutas favoráveis que os chefes devem ter. Já ocorreram duas reuniões. Nós colocamos nossas propostas para a convenção coletiva, com ações educativas para os gestores. Os banqueiros ficaram de estudar as propostas e a gente está aguardando. Nosso objetivo primeiro é colocar uma cláusula de combate ao assédio moral na nossa convenção coletiva. E a gente vai continuar a campanha porque quanto mais a pessoa entende o fenômeno, mais ela vai se sentir fortalecida para ter a coragem de denunciar ou pelo menos conversar com alguém. |