Fale Conosco       Acesse seu E-mail
 
Versão para impressão Diminuir tamanho das letras Voltar Página inicial Aumentar tamanho das letras


29/06/2006

Nossa Voz - AFBNB reafirma rejeição ao PCR

Análise: A cara do Brasil é o Nordeste

Por Alberto Amadei

Os governos nos últimos 15 anos reprimiram demasiadamente o gasto público, em decorrência da chamada modernização conservadora. O caminho opcional da política monetária e cambial completou o estrago formidável sobre o que restava dos pilares da questão regional, especialmente da “questão nordestina”.

O que nos teria levado – eis a questão – a abandonar a questão nordestina? Quais os argumentos centrais que soterraram a questão nordestina como se tal problemática não coubesse na modernidade recente? Que tipo de doença bestial terá acometido os governadores e acadêmicos do Nordeste, de modo a obliterarem sua capacidade estratégica de pensar a questão nordestina, perdidos em uma inútil e inoperante guerra fiscal entre pequenos estados miseráveis ilhados?

O mestre dos mestres reconheceu que – grosso modo – só com o investimento não se resolveria a questão nordestina. Isso porque havia por dentro da proposta da SUDENE, o pressuposto de que se a economia fosse industrializada – se os capitais entrassem para valer na base técnica da produção – o problema da região estaria suficientemente equacionado.  Os oportunistas aproveitaram a carona na autocrítica de Celso Furtado para enterrar a SUDENE.

O que ficou acendeu o sinal vermelho para Furtado foi a verificação empírica de uma espécie de “mau desenvolvimento”. As elites aproveitaram o fluxo dos capitais. O resultado da SUDENE, contudo, não alcançou a maioria da população, exceto uma classe média raquítica.
Furtado foi mais longe. Diz que o que fizemos foi insuficiente. Disse mais: erramos!
Pouco tempo antes de morrer, Furtado atacou o cerne da questão nordestina. Não abriu mão da necessidade de aumentar e intensificar o fluxo de capitais para a nossa região. Criticou, isso sim, a submissão da dinâmica econômica regional aos condicionamentos de fora para dentro.

Porém, no final da sua caminhada, sem tempo de sobra para concatenar o conjunto sofisticado da sua imaginação criadora, decidiu dirigir suas baterias certeiras sobre a questão nordestina em outro sentido.  Declarou, bom som, de que nada resolve a questão nordestina se não forem distribuídos dois ativos fundamentais: a terra e a educação.

Verdade que esta alternativa todos estamos cansados de ouvir. Até os gestores da Era Maldita ensaiaram modificar os critérios de reforma agrária e educação. Vale dizer, que se pode modernizar o Nordeste intensamente, mas não se fará a inclusão da população nordestina na dinâmica sócio-econômica do país, sem o acesso da plebe rude à terra e à educação.

Há uma tragédia em curso, que nega a alternativa furtadiana. Sobe de relevo uma tendência desastrosa no Nordeste: a fragmentação das iniciativas, de modo concorrencial.

Um tipo de “novo regionalismo”. Besteirol do tipo “ilhas de excelência”, como se fora possível seguir um caminho próprio independente do conjunto nordestino e do contexto geral. Uma espécie de “paroquialismo internacionalizado”. Algumas utopias do tipo Cingapuras dos Trópicos.

O único modo de distribuir os ativos de que falou o mestre dos mestres, na escala e intensidade necessárias a uma resposta tempestiva, exigiria satisfazer uma pré-condição: a unidade da mobilização política nordestina.

De certo modo, não seria inconveniente recriar uma espécie de Confederação do Equador, não para romper a unidade nacional, mas para fazer valer a questão nordestina, de forma a penetrar as carnes da Federação; hoje absorvida pela União.

Há um vírus pior ainda circulando nas veias dos tecnocratas nordestinos e uma viseira tapando o olhar da elite política nordestina. Imaginam, esses novos zarolhos do desenvolvimento, que basta fazerem parte da economia global, como se fossem um enclave extrovertido, para garantir a dinâmica interna do seu rincão. Há um nítido perigo morando aí. Pensar de costas para a nação.

O modelo cearense dos últimos anos entrou de cabeça nessa armadilha do pensamento. Acreditaram que poderiam fazer parte de um “regionalismo de ricos” e inserir a sua “ilha de excelência” na dinâmica virtuosa da economia global. Ledo engano. Pura ilha da fantasia.

Isso tudo, nos lembrou Furtado antes da viagem à eternidade, decorre de um processo mais amplo, mais grave e mais profundo. O processo de desconstrução do país. Segundo Celso Furtado, a questão nordestina foi atirada para a lata do lixo por conta dessa grande tendência, não só à fragmentação na capacidade de pensar o nordeste, quanto a criação de vários regionalismos dentro da região.

Há uma clara impossibilidade de assegurar o desenvolvimento do nordeste, sem que a questão nordestina seja tratada como um todo.

Repito o que tenho dito: falta uma postura firme do Nordeste, da sua classe política no Parlamento, para alterar a correlação das forças que nos afoga.

Fiquemos com o alerta de Celso Furtado que tanta falta ainda nos faz: “O tempo histórico se acelera e a contagem desse tempo se faz contra nós”.

É preciso dizer mais alguma coisa? Acredito que não.

Alberto Amadei é especialista em política fiscal pela FGV-RJ e co-autor de “Questão de Soberania - Auditoria da Dívida”, da Editora Contraponto e de “Reflexão sobre a sustentabilidade do Nordeste”, da Editora Konrad Adenauer

Última atualização: 30/11/-0001 às 00:00:00
Versão para impressão Diminuir tamanho das letras Voltar Página inicial Aumentar tamanho das letras
 

Colunas

Versão em PDF

Edições Anteriores

Clique aqui para visualizar todas as edições do Nossa Voz
 

Rua Nossa Senhora dos Remédios, 85
Benfica • Fortaleza/CE CEP • 60.020-120

www.igenio.com.br