Os revezes na recriação da Sudene
Está tramitando, na Comissão de Desenvolvimento Regional e Turismo do Senado Federal, o Projeto de Lei nº 59 que institui a Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste (Sudene). O relator do Projeto é o senador Antônio Carlos Magalhães (PFL-BA) e o presidente da Comissão, o senadorTasso Jereissati (PSDB-CE).
Se, por um lado, o projeto fortalece a Sudene – importante aliada no processo de redução das desigualdades regionais – da forma como está disposto, enfraquece instituições que têm uma história de luta e experiência em desenvolvimento regional, como DNOCS, BNB, Chesf e Codevasf. Isso porque exclui essas e outras instituições da instância que deliberará sobre as diretrizes e gerenciamento dos recursos: o Conselho Deliberativo. Além disso, o projeto não assegura ao BNB a operação dos recursos do Fundo Constitucional de Financiamento do Nordeste (FNE), nem do Fundo de Desenvolvimento do Nordeste (FDNE).
Para falar sobre o assunto, o Nossa Voz convidou o economista e ex-deputado federal Firmo de Castro. Aposentado do BNB, no qual foi técnico do ETENE e diretor da Instituição, Firmo de Castro é o atual conselheiro presidente da Santana Têxtil.
Nossa Voz – Qual a importância da recriação da Sudene no contexto atual, no qual a Região Nordeste ainda carece de uma política de desenvolvimento regional?
Firmo de Castro – Eu diria que a recriação da Sudene será importante não pelo fato de você estar refundando um órgão simplesmente, mas porque a Sudene simboliza o que seria todo um aparato institucional que inclui o Banco do Nordeste, como poderia incluir outros organismos com atuação setorial. E a retomada também de toda uma política de desenvolvimento. O que há por trás da idéia da recriação da Sudene, a meu ver, é muito mais, portanto, do que trazer a Sudene do passado, que já estava muito frágil, muito depreciada. Muito mais do que refundar o órgão, é fazer com essa iniciativa represente uma retomada de toda uma política de desenvolvimento regional e o restabelecimento dos programas de incentivos que foram abandonados. Nessa linha, é um momento novo, de volta, de reencontro com o desejo de se acabar com as desigualdades regionais. Por que o substitutivo apresentado pelo senador ACM ao projeto de recriação da Sudene se constitui numa ameaça ao FNE e, conseqüentemente, ao BNB?
Eu acho que o substitutivo do senador Antônio Carlos tem que ser visto pelo lado positivo, na medida em que repara o projeto de Lei Complementar elaborado pela Câmara – que é absolutamente inócuo, vazio, e precisa ser corrigido. O senador Antônio Carlos tentou, de certo modo, retomar o que poderia ser uma proposta com mais condições de produzir resultados positivos. Mas ela pode e deve ser bastante melhorada. Eu, pelo menos, sou um crítico de que não adianta imaginar uma nova proposta de desenvolvimento regional sem resolver as seqüelas e os espólios que aí estão: espólio do Finor, espólio do FNE, espólios que atingem o próprio BNB, que atingem a questão de recursos hídricos etc. Então eu acho que ela tem que vir já precedida de uma solução desse passivo, para que a Região não fique imobilizada e possa então participar e tirar proveito dessa nova política. Além disso, existem pontos específicos que me parecem equivocados. No que diz respeito ao FNE, no momento em que o projeto estabelece um mecanismo operacional onde retira algumas funções básicas do Banco do Nordeste, admitindo que esse fundo poderá ser operacionalizado pela iniciativa privada, sem a supervisão ou a coordenação efetiva do BNB, eu acho que a proposta está, na verdade, nos levando a um desmantelamento dos objetivos que nós queremos ter para o FNE e que nós sabemos que a banca privada não tem compromisso com eles. No momento em que a proposta também leva ao esvaziamento de receitas importantes do Banco do Nordeste, é preciso que a gente tenha a plena consciência de que com isso nós poderemos até estar ferindo de morte o Banco, o seu equilíbrio financeiro. E ferindo de morte o Banco do Nordeste, efetivamente estaremos destruindo o nosso próprio interesse de ter uma nova e forte política regional. Porque, do ponto de vista do aparato institucional, o BNB é, sem dúvida, o maior instrumento que a gente tem, a peça principal dessa política.
O que pode ser feito para evitar a aprovação do substitutivo tal como ele se apresenta agora?
O Banco do Nordeste, enquanto Instituição, primeiro até do que a AFBNB, tem a obrigação de resistir, de esclarecer ao governo e até aos setores não governamentais que essa proposta pode e deve ser apoiada, mas que precisa ser aperfeiçoada. Essa é uma questão importante porque o BNB é, sem dúvida, nessa altura, o órgão que mais poderá ser atingido – positiva ou negativamente – por esse novo projeto de Lei Complementar. E a Associação, tendo a legitimidade de também defender, mais do que qualquer outra entidade, os interesses da Instituição da qual ela deriva, também tem o direito – e eu diria a obrigação – de levantar e procurar colaborar na discussão política, na discussão técnica e no esclarecimento dos setores que vão estar envolvidos na aprovação sobre os riscos que nós vamos correr e na necessidade dos aperfeiçoamentos que nós vamos ter que fazer. Eu acho que a Associação, até honrando a sua história, assim como a própria AABNB, está cumprindo um papel importante e não poderia ficar ausente da tramitação de um projeto de Lei que poderá trazer repercussões negativas para o Banco do Nordeste. |